A cidade está cheia, mas eu sinto-a vazia.
Os poços cavados, à força braçal, estão secos e fissurados.
Paredes rendilhadas elevam-se na direcção das terras que não cavei e colho o que não plantei. Posso comer tudo o que o dinheiro pode comprar.
Sinto que caminho por uma estrada aberta Carnide desabrocha e o dia sopra nevoeiro que me ajuda a afugentar o tempo.
Serpenteio por azinhagas paralelamente marcadas, dispersa E embalada ao som do chilrear de um pardal que belisca envergonhado o botão da camisa de um espantalho.
Pardal estudioso, letrado e doutorado pela natureza, planeia a vingança antecipada.
O recado está transmitido, e as suas chamas São chamas que não ardem, esvoaça e tenta voar.
Santinho o pardal, pensa o espantalho que adivinha.
Milagre. Quem sabe? Mas por vezes o belo é idolatrado, e a natureza vence a incerteza.
Continuo a tatuar no papel a beleza que não quero esquecer.
Bom Norte
Comentários