Campo da Morte Decreto-Lei 26 de 1936
Colónia Penal do Tarrafal
Clima árido! Está tanto calor!
Todos os dias a mesma coisa! Mas hoje parece-me que algo mudou?
Ficou mais fresco! Até sinto frio!
Olho para o céu pedindo perdão. Sinto que chegou a minha hora
Estou tão triste e cansado! Penso nos meus camaradas que partiram
E quero me juntar a eles! Os guardas avançam na minha direcção!
Será que chegou a minha hora? Será que me vou embora?
Será que estou aqui por uma causa ou por uma consequência!
De repente o calor me esturrava o cérebro abrandou! E a pomba no céu apareceu!
Será a minha salvação?
A Febre biliosa, tuberculose, maus tratos, negligência terapêutica afastam-se de mim e partem à procura de outros camaradas !
Estou feliz! Vou partir! Quero ser livre!
Rapaziada! Chegou a minha vez!!
Fica livre a minha cama!
Se alguém quiser o meu copo?
O meu coração bate com força! Muita força mesmo!
Que se passa comigo?
Olho para mim! Estou magro e feio! Tanto sofrimento. Será que valeu a pena!
Colónia Penal do Tarrafal! Que nojo! Até o nome me dá vómitos!
Ao longe os meus camaradas olham para mim com um olhar de sofrimento? Ou será de inveja por eu partir?
Sou o 32 da lista dos que partiram!
Sempre gostei deste numero! Um bom numero!!
Um a um os meus camaradas tentam aproximar-se de mim!
Que será que querem? Eu vou-me embora será que não compreendem!
Que ar é esse? Até parece que vou preso?
Um pouco de ironia! Para animar o pessoal!
António os 20$00 que me deves! Podes ficar com eles!
Coiado! Pobre diabo! Ainda nem conheceu o filho que nasceu!
Tenho dores! Mesmo muitas dores!
Tento levantar a cabeça! Mas é em vão.
Que engraçado eu tinha uma pena especial oferta do Salazar!
De repente apetece-me ouvir um Fado! Tenho saudades de Lisboa!
Lisboa que foi cruel para nós mas que tanto Amo!
Tento cantar uma canção!
“Um campo de morte lenta que se chama Tarrafal!
Uma oferta especial de um amigo Salazar…..”
Rio-me! Rio-me!!!!Que má canção!
De repente começo a chorar!
Choro! Choro!
Que raio!!! Estou farto disto! Quero partir!
Será que Deus é assim tão cruel que tenta contrariar a minha vontade!
Falo e choro para quem me quer ouvir!
Os meus camaradas afastam-se e olham para o céu!
Eu amo a vida mas estou farto da minha luta que talvez tenha sido em vão?
A minha língua já não me deixa falar! Está presa e seca!
As minhas mão estão tremulas e já velhas e enrugadas!
Apetece-me rezar!
Avé Maria cheia de graça……!
Com as minha mãos tento desenhar uma cruz na areia do chão! Mas em vão?
Rezo! Rezo! E padeço! Quero partir!
Os guardas avançam e continuam a avançar!
E falam! Falam entre eles!
Ouço uma musica muito baixinho!!!
Um anjo desce na minha direcção!
Estica a sua mão e agarra-me ! Sinto-me leve e rejuvenescido!
E Levanto-me. Sinto-me novo!
Consigo levitar! Sou um pássaro!
Os meus camaradas regressam ás celas! Todos em fila! Tristes e humilhados!
E eu Parto!
Sinto-me feliz e com Paz!
À tanto tempo que não me sentia assim!
Sinto que parto com um sentimento de trabalho feito!
Quero só dizer uma ultima coisa aos meus camaradas! Somente uma coisa!
Lutai por aquilo que acreditas!
E nunca digas que não és capaz!
Parto! Que belo é o azul do céu!
Junto-me aos meus 31 camaradas e partimos para casa!
E a nossa Alma paira pelo azul do céu em busca de sossego e descanço!
Sei que somos capazes!
Decreto-Lei 26 de 1936
Mortos no Tarrafal
Augusto Costa
Rafael Tobias Pinto da Silva
Francisco Domingues Quintas
Francisco José Pereira
Pedro Matos Filipe
Cândido Alves Barja
Abílio Augusto Belchior
Alfredo Caldeira
Fernando Alcobia
Jaime Fonseca de Sousa
Albino Coelho
Arnaldo Simões Januário
Mário Castelhano
Jacinto Faria Vilaça
Casimiro Ferreira
Albino de Carvalho
António Guedes Oliveira e Silva
Ernesto José Ribeiro
José Lopes Dinis
Henriques Domingues Fernandes
Bento António Gonçalves
Damásio Martins Pereira
Fernando Óscar Gaspar
António de Jesus Branco
Paulo José Dias
Joaquim Montes
José Manuel Alves dos Reis
Francisco do Nascimento Gomes
Edmundo Gonçalves
Manuel Augusto da Costa
Augusto Oliveira
Joaquim Marreiros
António Guerra
RIP
@BomNorte2010
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