Que emoção. Manda a tradição que a peça comece. E não seja aborrecida
E por entre os cenários que me abraçam, sinto que sou um cordel que balança nervoso
O público torna-me frágil e danço e canto. E sinto que não tenho margem
Nem margem para erros. Sou uma pequena porção e uma fracção de um enredo que te tenta encantar.
Ainda não são horas de recolher os aplausos. O murmurinho que se sente na sala. São tormentos que me fazem dor nos pulsos. E ouço o segredar de um namorado que tenta a sua dama encantar. Doce pecado que paira no ar, palreio doce de adormecer.
Os focos focalizam um ser em sofrimento, a árvore que compõem o cenário oferece os seus braços ao canário que canta apaixonado.
O tempo demora a passar e lentamente todos os meus receios abandonam o meu desempenho e rio-me. Estou satisfeito. Completamente radiante.
Os actores gritam e lançam para o ar todo o texto decorado e imensamente ensaiado.
Gosto de ser aplaudido e detestamos ser vaiados.
Somos vaidosos, e impiedosos com o nosso trabalho.
Sofremos convulsões de secura. A garganta sofre compressões pelas incompreensões
Lá fora manadas de seres ignorantes ignoram o nosso trabalho e correm numa correria sem freio.
Somos uma cor amarelada com pintas amarelas. Uma colmeia que alguém me diz que oferece mel. Um sabor a fel que me fere e repele.
Alguém nos aplaude de pé e eu sinto fé. E olho de soslaio os meus colegas que me entregam a sua arte.
Sou alguém que parte quando surge a luz, é a formidanda serpente do medo.
Detesto errar. Repito para mim lentamente. Estou apeado, sinto que sou um farrapo de papel.
E no meio de tanto sofrimento.
O público levanta-se e aplaude de pé. Tudo se movimenta agora. Todos contemplam os nossos olhos que se desviam envergonhados.
Todos nós nos inclinamos e agradecemos. As flores voam na nossa direcção. As rosas que outrora tiveram espinhos deixam de ser agrestes e enrolam-se aos nossos pés, tornando-nos deuses e figuras mitológicas.
O pano vermelho já gasto e cansado de tantos movimentos desce. E a companhia pouco a pouco desaparece.
Cá a trás brinda-se ao sucesso os rostos estão purpura de tanta emoção, cabelos desguedelhados e corpos suados.
esfregamos as nossas mãos incessantemente nas nossas roupas tentando a todo o custo esgotar as gotas de suor que persistem brotar.
Os disjuntor vão sendo desligados e os sectores pouco a pouco vão perdendo cor. As luzes vão se apagando uma a uma
As portas fecham-se e a entrada transforma-se em saída e é fechada com todas as voltas e mais voltas que a despedida possa dar.
A rua está humida e fria. A solidão invade o meu coração. A tarde já há muito tombou, e a noite já há horas que nasceu.
E eu?
Eu caminho pela rua tornando-me em mais um ser errante. um ponteiro dos segundos que persegue os minutos em todas as horas que o dia tem. Tento a todo o custo me misturar no meio de uma cidade que o ignora.
@BomNorte2010
Uma Homenagem a todos os artistas que pisam o palco.
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